sábado, 29 de dezembro de 2007

quarta-feira, 26 de dezembro de 2007

A Cara do Estado é a Estrada

Às vezes a gente acostuma tanto com nosso jeito de ser, fazer coisas, com o que vimos na TV e nos países vizinhos que a gente esquece que tem soluções diametralmente opostas para problemas equivalentes. Viajar ajuda a lembrar. Comecei a pensar nisso quando avaliei como umas horas na estrada podem te falar muito sobre um país.

Me lembro ainda criança, quando estive nos EUA, passeando por uma estrada impecavelmente lisa e reta que, incrivelmente, tinha limite de velocidade... mínima! Via de regra, a disciplina dos estadunidenses na estrada (e de muitos países europeus, provavelmente) é tamanha que o sujeito liga o estabilizador de velocidade nas 60 milhas e larga o pé do acelerador. E carro (ou motorista) velho que não chega a 40 mph nem entra. Guiar na estrada (em uma highway decente) lá é praticamente sinônimo de esterçar o volante de quando em quando.

Já no Brasil, convivem os esportivos importados último modelo - um passarinho me disse que o Brasil é o terceiro mercado mundial de Ferrari - com o 'utilitário' 1.0 flex, o corcel 73 e a frota de caminhões mal conservados que fazem o trabalho sujo do transporte de mercadorias. E, em algum escritório em algum canto do país, engenheiros do Departamento de Estradas e Rodagem (DER) - uns bem intencionados, outros puxando a sardinha para algum escuso interesse privado - tentam achar uma fórmula maluca pra que a coisa ande. Meio que lembra o planalto, não?

Em Angola, a tentativa de estrada que passa no meio dos buracos que se estendem de norte a sul no país dispõe de elementos que tornam o deslocamento mais emocionante que River Raid de madrugada escondido da mãe: além dos buracos supracitados, minas remanescentes da recente guerra civil escondem-se embaixo da terra em determinados trechos das margens da estrada; guia-se de uma maneira, digamos, intrépida (lembre: isso não é um elogio!); e para finalizar bichos cruzam a pista de vez em quando pra assustar ainda mais o motorista escaldado - e, de toda a escassa fauna remanescente no país, o bicho mais assustador nesta circunstância é o policial rodoviário, mais corrupto que padre da Record. Aí, pra completar o cenário, com os petrodólares que jorram do norte, o governo angolano contrata os chineses pra reconstruir estas estradas. Ora, uma coisa é comprar o abridor de 1,99 made in china porque se perder ou quebrar, compra logo outro, talvez na próxima cria coragem ou vergonha na cara e compra logo um de aço inox. Outra coisa é uma estrada feita por ambiciosos engenheiros chineses supervisionada por políticos angolanos corruptos. Coisa boa daí não sai.

Viajar pelas estradas da Índia, no entanto, novamente supera os parâmetros convencionas. O estado variado das estradas geralmente pende pro muito ruim, em que mal cabe um veículo na pista que, no entanto, é duplo-sentido; o asfalto é notoriamente esburacado; vacas, cabras, porcos cruzam a pista calmamente, não importa se é cidade ou campo. Tá, até aí, não é muita novidade pra brasileiro pé-na-estrada que já pegou transamazônica de jamanta, Belém-Brasília de busão ou Rio-Recife de bicicleta. Mas a novidade se anuncia com um curioso anúncio presente na traseira de 100% dos coloridos caminhões e tratores do caminho: "Please Blow Horn"... Buzine, por favor?

O hábito de guiar, para este povo com que temos contato - sei que no Nepal e Tibete funciona parecido - se assemelha à personalidade deles no dia a dia: dispersa, resolvendo aquele instante como se fosse o único, sem se preocupar muito com o que vai à frente nem com o que vem atrás. Retrovisor, quê isso? Buzine, pliz.

Pra lidar com as ruas e estradas da Índia tem que fazer que nem com cachorro brabo: não importa o quanto o bicho corre e ladra em sua direção, continue fazendo o que está fazendo, passeando em bicicleta, caminhando pela rua, conversando com o sorveteiro. Não dê atenção ao cão, por mais feroz que pareça. Se você demonstrar medo ou correr, o mais provável é voltar pra casa, no mínimo, com uma mordida na canela - claro que, se estiver roubando jaboticaba do quintal do vizinho, aí tem mais é que correr mesmo.

Mas se você estiver guiando ou até mesmo cruzando a rua na Índia, o negócio é não fazer movimentos bruscos, tudo deve ser suave. Se está caminhando, ouve uma horda de frenéticas buzinas, continue caminhando, cruze a rua devagar, mesmo que dezenas de scooters, motos, auto-rickshaws, bicicletas, vacas, carros e até caminhões venham caoticamente em sua direção. Se ouvir uma buzina, não se desespere, não saia correndo, apenas saiba que atrás vem gente. Se estiver guiando, confie que o caminhão que se aproxima em feroz contramão não tem a intenção de se chocar nem de te assustar; ele vai voltar para seu lugar, provavelmente antes do temido incidente. Ou então ele, bem como o motorista de seu veículo, sabem que o acostamento está lá, pra isso mesmo.

Assim, quando seu ônibus está passando o caminhão que está passando o auto-rickshaw, que está passando o rickshaw, que está passando a bicicleta, que está passando o cidadão, que está passando a vaca, tudo isso no meio da curva pra esquerda ao lado do precipício à direita, e aparece uma jamanta no sentido oposto, lembre que, pra sua sorte, ambos os motoristas são indianos.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

O Tempo e a Privada na Índia

O tempo é um recurso incrível que a humanidade capturou da natureza a partir dos ciclos astrais. Tem o calendário maia, composto por 20 dias e 19 meses; o nepalês, que está 79 anos adiantado; o baiano, que deve ter uns 300 feriados por ano; o asteca, que não tenho idéia como funciona, mas é famoso e por isso achei que dava ibope; o católico baseado no nascimento de Cristo etc. Apesar das diferenças entre esses e outros calendários, todos cumprem a função de parametrizar o tempo, permitindo que as sociedades se organizem ora com o intento de aumentar sua capacidade produtiva, ora com o intento de prever fenômenos naturais como eclipses, ora movido por interesses do sacro, ora do santo (capital, claro). No final, entretanto, parametrizar o tempo reflete necessariamente uma busca por coordenação entre diferentes partes.

No entanto, no folclore popular, há situações em que o relógio não cabe. Quando alguém me pergunta há quanto tempo cheguei a um boteco, respondo prontamente na medida de tempo adequada: "Há três chopps e meio."

Ou, assistindo a um jogo do Brasil, um diálogo perfeitamente cabível seria:

- Cara, foi mal, cheguei atrasado! Quanto tempo do jogo com o Dubai eu perdi?
- Cara, você demorou muito.
- O Ronaldinho já pegou na bola?
- Já... Duas vezes!
- Pô, então já tá no segundo tempo?

Nós, aqui na Índia, na pequena cidade sagrada de Pushkar encontramos um casal super simpático de brasileiros - Guto e Gabriela - e engajamos logo uma conversinha daquela típica quebra-gelo de viajante: de onde vocês são e onde moram no Brasil? O que você faz? E você? O Corinthians caiu mesmo ou é trote dos Saopaulinos? Qual seu próximo destino na Índia?

Até que fatalmente pintou a questão temporal:

- E desde quando vocês estão na Índia?
- Hmmm, fiz rapidamente as contas. Três caganeiras, arrematei.

É. A unidade de tempo na Índia do turista branquelo cheirosinho do ocidente é definitivamente a performance evacuativa. Afinal, se você veio pra Índia e não fez uma respeitável coleção de caganeiras - me desculpem a franqueza - mas você não viveu o país em sua, digamos, plenitude cultural.

Esporte de Viagem

Sempre gostei de esportes. Nunca fui fanático, estilo cara da atlética ou capitão do time - talvez mesmo por falta de competência -, mas sempre joguei, treinei, me diverti e mantive uma forma física, se não invejável, ao menos aceitável.

Viajando, no entanto, é difícil manter a rotina. Quando é viagem a trabalho, se sobra um tempo dá até pra dar uma corridinha, mas é exceção. Já em viagem longa como esta, não é viável, por exemplo, carregar um Nike Air ou chuteira society. Nem nunca a gente fica estável em um lugar pra encaixar num basquete ou futebolzinho semanal.

O resultado é fatal: nada de esportes normais como futebol, vôlei, natação ou uma corridinha esperta. O máximo que consegui, com esforço, foi um vôlei na praia em Zanzibar com uns branquelos dinamarqueses e uma troca de embaixadinhas com molecada no Nepal. Pouco. Mas nada que a gente não substitua com um pouco de criatividade.

Assim nasceu o fotol. O fotol, categoria desportiva típica do adolescente, é muito simples: trata-se de se meter correndo nas fotos alheias, preferencialmente fazendo uma esforçada careta, sem que o fotógrafo ou o fotografado perceba. Imagine clicar aquele momento romântico com a Victoria Falls e um arco-íris, durante a lua de mel dos pombinhos, e descobrir, na hora de fazer um porta-retrato, que tem um mané com a língua pra fora no fundo? Ou que a noiva tá de chifrinho? Ou que o noivo tem 4 braços?

Eu sei, é bem besta. Por isso mesmo, não sei se porque amadureci ou por conta da revolução das câmeras digitais, deixei de praticar o fotol um tempo atrás. Porém esta semana, ao visitar o sensacional Taj Mahal, tive uma recaída...

Fato é que hordas de famílias de animadíssimos indianos visitam diariamente a famosa tumba de mármore - nesta época do ano deve ser uma proporção de 10 indianos para 1 estrangeiro. Mas o mais curioso é que a maioria dos grupos leva consigo um - ou mais - fotógrafo, digamos, profissional. E o que é mais legal é que os fotógrafos ainda utilizam câmera analógica, digamos, profissional. Hmmm...

Ok, você vai dizer, mas você já tem mais de 30, tenha dó! Sim, admito. Mas explico dois motivos:

(1) Tem que ver pra crer a enormidade de fotos que se tira com todas as variações de composições - Sir and Madam, only Madam, Madam and Young Lady, Sir and Young Lady, Sir, atrás da Madam, mão no ombro, sorriso... meia hora e os caras continuavam no lugar mais VIP do Taj, enquanto isso uma fila de turistas europeus insuportavelmente pacientes acumulava esperando para poder tirar a típica foto do edifício com o reflexo no espelho d'água;

(2) Cada pose... meu, o indiano tem um lado brega invejável, que vai desde as roupas (em particular as bocas de sino masculinas) até a originalíssima Bollywood (aliás, assistimos a um filme animal ontem em um cinema que parece um dantop gigante! Em breve o depoimento). Posava Madam de ladinho, com as perninhas em cima do banco, com as mãos no joelho, olhando pro céu; posava Sir em pé atrás de Madam sentadinha, no melhor estilo faroeste; isso quando não pedem pra você, ocidental, sair na foto; e por aí vai.

(O que é mais legal é que eles sabem o quanto é brega, e dão risada de tudo! Comecei a imitar o fotógrafo e os fotografados e encheu de indiano - inclusive os fotógrafos - rachando o bico!)

Por isso conclui que eles não vão achar ruim um barbudo - aliás aqui já virei Ali Babá - fazendo estripulias no álbum de fotos deles. Bem de acordo com o humor indiano.


Sir and Madam

India, primeras impresiones


Con la querida Louise, la australiana que nos ha estado acompanhando en el recorrido por la India
Agra
Orchha
Orchha
Khajuraho






Puja en el Ganges
"la reina"
templos er'oticos



en el rickshaw!

los novios








Varanasi











Desde el día en que llegamos a la India que estoy pensando si quiero irme o seguir aquí, es un lugar intenso, que la mayoría de las veces me incomoda extremamente, pero en otros momentos y no es que me encante ("gustar" realmente no es la palabra que escogería), me impresiona y me tiene "a flor de piel" reflexionando sobre las cosas y creo que es eso lo que me mantiene a seguir viajando por aquí.

Trato de entender a la India, pero para mí, con mi cabecita occidental, es incomprensible, a pesar de mis esfuerzos. Todo es tan diferente y no me refiero sólo al plano espiritual y la intensidad de la religiosidad, sino que al completo cotidiano.

He estado tratando de entender a la India mirándola desde dentro de ella, y tratando de dejar mi lado "lady" absolutamente de lado, pero la verdad es que sólo me he llevado tropiezos. No soporto la caca que es omnipresente en este lugar, tengo rabia de la insistensia de vendedores, rickshaws (taxis-bicicletas) y auto-rickshaws, dueños de hoteles, restaurantes, tiendas , etc., que parece que fuesen inmunes al a palabra "no", me descomponen las triquiñuelas (=armadilhas) para sacarte plata extra, no aguanto la basura y la contaminación (=poluição), me frustran las personas pidiendo limosna y el teatro de la auto piedad, y es ya es suficiente el olor a pipi, e incluso las catarradas, los escupitajos, y los "gases". Pero lo que más, más me molesta y me duele es que quiero conversar con los indios y no lo logro, cuando creo que conseguí una conversa sincera ahí viene el interés, el interés de cada uno de pedirte algo, plata, chocolate, "tiping" (propina), tu ropa, "pen", "donation", un aparato para medir la presión, o hasta tu disposición "íntima-femenina" preguntando si "tienes novio" o expresando disimuladamente su lado obseno después de que simplemente querías conversar.

Pareciera que soy una billetera (=carteira) ambulante, un objeto con el que ellos no son capaces de conversar "gratis". Me desilusiona, y quisiera poder expresarme de una manera más positiva, pero es como me siento.

Estoy desahogándome en mi escritura y lamento mucho dejar la imagen de la India tan en el suelo, y lo siento más aún por los que sueñan con alguna vez venir para acá o con los que ya vinieron y no vivieron la India como yo, pero tengo la necesidad de compartir con ustedes, las personas que quiero, el cómo me siento y el ser sincera, porque realmente, para mí especialmente, no ha sido fácil viajar por aquí.

Pero "no lo he visto todo gris (=cinza)" y por algo sigo y quiero seguir aquí, porque vimos ceremonias absolutamente maravillosas, intensas y completas para todos los sentidos a la orilla del Ganges en Varanasi, porque nos asombró el detalle y el trabajo absolutamente sublime de los templos heróticos en Khajuraho, porque caminamos entre el pasado de Orchha visto en su palacio y templos y la vida pequeñamente tranquila de la ciudad, porque el majestuoso Taj Mahal lindo, maravilloso, brillando en su blancura y en su grandiosa delicadeza nos dejó con la boca abierta, porque las risas bonitas de los indios en una sesión de cine "bollywood" (hollywood indio para los que no sepan) nos contagiaron con una película magistralmente "cursi" y porque los atardeceres en Pushkar escuchando los mantras desde una terraza con vista al lago nos tranquilizaron.
Pero hay algo que me molesta y me deja tensa y es que no puedo entregarme a los indios, porque no confío en ellos... y desde que llegué pienso "mañana va a ser diferente".
Y no lo es...

segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

Regra ou Acordo

Completamos 15 dias na Índia, intensos suficientes para começar com minhas especulações. A forma como as "coisas funcionam" neste país - ou ao menos na pequena porção que estamos visitando - é sensacionalmente original e estranha a nossos modelos ocidentais. Olhamos para Suíça como modelo de organização, Alemanha como modelo de disciplina, EUA como modelo de eficiência, Estados que, aos olhos do Jornal Nacional, 'funcionam'. Olhamos para o Brasil e vemos como a implacável criatividade popular enche de areia estes modelos e a sociedade civil se fragmenta em micro-sociedades paralelas - por vezes nem tão micro -, que poderíamos chamar de marginais, se não fossem maiorias: economia informal, assentamento de terra, sonegação de impostos, PromoCenter e por aí vai. Exemplos um pouco mais cotidianos como pegar uma pequena contramão inocente, esconder uma garrafa de cerveja na hora da conta no boteco, parar em vaga de deficiente no shopping na véspera de natal, ou furar (qualquer) fila, não soam como novidade para nenhum brasileiro. Mas soam como marginal. E tem muita gente cheia de classe criticando, sonhando com o tédio da sociedade que 'funciona'.

Posso dizer que costumava engrossar o coro. Nos últimos 7 anos, entretanto, frequentei o Chile quase como quem tem uma casa em Mongaguá - por motivos óbvios pros que me conhecem - e comecei a me dar conta de que as coisas são mais indissociáveis do que parecem: a música, a cultura, a comida, a criatividade que tanto celebramos - e que estão cansadas de arrebatar prêmio internacional (arte, arquitetura, publicidade, cinema etc.) - andam de mãos atadas com o lado esculachado e improvisado da sociedade brasileira.

Nosso roteiro de África e Ásia acrescentou muita coisa nesta relfexão. Aparentemente - e ocasionalmente - escolhemos um roteiro de entropia crescente. Cada lugar que pousamos parece dotado de uma complexidade maior que o anterior. Posso afirmar, porém, que o futuro não superará, de forma alguma, a Índia. Porque simplesmente não dá, esse lugar é tão inexplicável, quanto delicioso de explicar.

Olhando os modelinhos - aqueles do Jornal Nacional -, o Brasil tá no meio do caminho: o nível de flexibilidade que buracos no tecido social proporcionam - corrupção, informalidade e tal - não são aproveitados por todos, gerando uma constante crise moral. Os que aproveitam se acham apenas parte do sistema, que é falho; os que respeitam se sentem lesados. Mas este tipo de crise moral não vi até agora na Índia. Muito pelo contrário!

Os indianos não tem o menor pudor em desrespeitar regras que, pra começo de conversa, já não são muitas: o trânsito funciona de maneira quase incompreensível e cruzar a rua é sempre um esporte radical; não tem preço em nada, pouca informação aparece escrita; os caras são extremamente dispersos, fazendo mil coisas ao mesmo tempo; evidentemente não tem placa nas ruas; o rickshaw negocia o preço antes de saber sequer aonde você vai; policial pedindo gorjeta; e, por fim, não sei quem foi o idiota que cunhou a expressão 'fila indiana' - deve ser o mesmo que inventou o brasileiríssimo 'pão francês' -, só sei que ele nunca esteve por aqui.

Evidentemente esta descrição não é suficiente nem para uma pitada do curry social indiano. Mas o que conta é que a sociedade que estamos experimentando nestes primeiros 15 dias funciona de um jeito assustadoramente dinâmico, improvisado, altamente caótico e anárquico. Soa ruim?, mas não é.

A regra é um mal necessário de sociedades apolíneas, que funcionam na base da disciplina e do porrete, ou ordem e progresso como defenderiam os positivistas que fizeram nossa bandeira. Quando não se consegue acordo no bom senso, apela-se para a autoridade, para o poder instituído. Basta olhar para os tribunais do ocidente - em particular dos EUA - para ver se é um caminho flexível, com limites evidentes e bom senso comandando as ações. Claro que nâo. Porrete então.

Em uma sociedade predominantemente dionisíaca como a indiana - puta bom humor, pouca preocupação e estresse com o cotidiano, espiritualidade presente, zero planejamento para o cidadão comum - a flexibilidade é fundamental. Mas ela só pode funcionar se vier acompanhada de três ingredientes básicos na personalidade do povo: criatividade para improvisar e tolerância para aceitar o improviso, além de generosidade para aceitar o problema do próximo como seu. Surgindo o imprevisto - coisa previsível que aconteça - o cara não apenas não esquenta a cabeça, como é esperto suficiente para contornar e ainda conta com a ajuda do desconhecido que passa na rua.

Claro que assim parece muito bonitinho. E não é. Não é perfeito, não é fácil, muitas vezes não é agradável - nem pra eles. Mas é diferente. E 'funciona'.

Será que o Jornal Nacional já olhou alguma vez pro lado de cá?

Ihh, Virou Paisagem!

Já fiz uma reflexão, anteriormente, sobre as novidades de uma viagem, sobre como o infindável universo de paisagens, pessoas, coisas, gestos, sons, comidas, estimula o viajante a prosseguir suas aventuras de forma doentia e insaciável (Ver: "Até que o Mundo se Repita"). Esta reflexão tem um fundamento científico em um famoso postulado das ciências cognitivas e da informação: informação é diferença. Explico.

Quando você aprende a guiar, seu estado de consciência é de alerta, até se 'acostumar' com a rotina do carro. Depois de um tempo, 'acostumado', você vai no 'piloto automático', poodendo conversar normalmente, ouvindo rádio, fechando negócio ou combinando cinema no celular, sem afetar - muito! - suas manobras. No entanto, se ouvir um ruído estranho na embreagem quando mudar a marcha ou ao acionar o freio, você entrará em estado de alerta novamente, porque sabe que alguma coisa pode estar errado. Por que você conclui isso? Porque no momento que você 'distingue' um barulho que não é normal, ele é diferença, é uma informação, é um imprevisto. Ao passo que o tal 'piloto automático' é a repetição, é o movimento praticamente involuntário ensinado ao corpo para lidar com a rotina sem maior esforço.

Viajando, ocorrem os dois processos com frequência. Tudo é novidade em um primeiro momento, corpo alerta, sentidos ligados em tudo. Mas com a frequência qualquer maravilha cai na repetição e no trivial. Eu digo que 'vira paisagem'. O primeiro, segundo, terceiro monastério tibetano são sensacionais. No entanto, se você não for budista, não tiver grande conhecimento da cultura, dos valores, da história, da simbologia etc, o quarto, quinto, o trigésimo-primeiro monastério - estima-se um total de 4 mil hoje em dia, mas já houve a espetacular cifra de 400 mil no auge do budismo tibetano - aparentemente não agrega nenhuma informação. É um processo meio depressivo, em que o êxtase de chegar a uma praia paradisíaca em Zanzibar, atingir o topo do Kilimanjaro, ver o primeiro leão na Namíbia, topar com a primeira stupa no meio da cidade em Kathmandu, no Nepal, ou entrar no primeiro monastério tibetano decai paulatinamente, perde o que chamamos de 'graça', perde a novidade. Aquilo que parecia um novo mundo, uma coisa inacreditável, uma realização da humanidade, um espetáculo da natureza, vira comum.

- Ih, virou paisagem, penso.

Temos, neste momento, que tomar cuidado com o turismo de consumo, aquele que mencionei que conta o número de países visitados e fica riscando os "100 lugares do mundo que você tem que conhecer antes de morrer" ou outras aberrações da intersecção do turismo com a sociedade de consumo. É hora de buscar a graça no detalhe, ler a história, fazer um desenho, sem a falsa esperança de esgotar as possibilidades, mas sem desprezar a pluralidade de informações que estes monumentos, obras, paisagens, reservam em suas entrelinhas. Em uma destas entrelinhas você pode encontrar algo que estava ali, escondido no canto, atrás da porta ou através da janela, reservado pra você.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

Viajar Também é Se Perder

Na minha dissertação de mestrado eu defendi que 'navegar' na internet inclui se perder como parte legítima da experiência do ciberespaço. Ora, viajar não pode ser diferente.

Sim, eu tenho bússola (gracias al amigo Pato!). Sim, eu tenho mapa. Mas e se não quiser usar? Hein? Hein?

Na primeira vez que andei de ônibus em minha vida, em vez de ir pra Consolação, fui parar em Diadema. Tinha 12 anos. Em vez de traumatizar o burguezinho que chegou em casa 6 horas depois, a desventura gerou uma estranha sensação de liberdade. Nada como não saber exatamente onde está ou para onde vai.

Imagine andar errante em Roma e aterrissar por acaso no Coliseu? Ou sair do metrô Trianon no gogó do MASP em São Paulo? Passear de bicicleta por Paris e topar com o Arco do Triunfo? Abrir a janelinha do avião e assustar com a imponência dos Himalaias? Descobrir o Taj Mahal por detrás das árvores em cima de um rickshaw? Tudo isso só ganha aquele quê de surpreendente se você 'esquecer' o (Not-So)Lonely Planet em casa e deixar a sorte te levar.

Existem lugares, no entanto, que são particularmente afeitos a quem gosta de se perder. Listo aqui alguns favoritos: o pelourinho de Salvador, os quatro cantos de Olinda, o sobe-desce de Ouro Preto, a tranquilidade de Salamanca, o caos de Thamel no Nepal, o museu ao ar livre de Valparaíso, o enxame de motos de Stone Town em Zanzibar.

Qual seu labirinto favorito?

Fica a provocação a quem quiser contribuir e deixar seu labirinto favorito num comentário aqui no blog!

E o Direito Autoral do Elefante?

Pois é. Em tempos de copyright versus copyleft, todo mundo esqueceu do elefante. Explico.

Após analisar batatinhas fritas e coxinhas e com isso tirar conclusões sérias sobre a indústria de um país, é hora de levar a viagem a sério e analisar um índice verdadeiramente representativo de um povo: a cerveja.

Cerveja é um treco muito popular na maioria dos países. Tirando os muçulmanos, hindus e outros que não aceitam o álcool nem socialmente - nem sociopaticamente como é o caso do ocidente - a cerveja é aquele coringa: é álcool, mas quase não é... Uma cervejinha no almoço não pega mal como um scotch ou um rabo de galo.

Um produto vulgar como a cerveja, com tamanho alcance, merece nomes relativamente simples, que nem título de música do Zezé de Camargo. Tem que ser algo cativante, que caia facilmente na boca do povo, que cative o imaginário da gente do lugar e dos eventuais visitantes.

Esta reflexão veio impulsionada pela profunda investigação científica autônoma que venho promovendo com esta viagem. Pelos bares do caminho, degustei cervejas cujos nomes são extremamente representativos do imaginário popular: na Zâmbia, a Mosi remete ao maior símbolo do país (curto para o nome original da 'Victoria Falls', 'Mosi na Tunya', ou Smoke that thunders, bem melhor que o inglês paga-pau de rainha); no Nepal, evidente que o imponente Everest está bem representado; na Tanzânia tanto a Savana, quanto a Serenghetti (parque nacional) e o inesquecível Kilimanjaro têm sua contrapartida igualmente inesquecível de cevada; no Quênia a amarga Tusker exibe o desenho de um elefante evidenciando o dente de marfim a que o nome faz menção; por fim, até na Índia o Martim Pescador (Kingfisher) está nas mesas dos ocidentais que pagam o preço de duas refeições por uma garrafa do danado líquido.

Aqui cabe um parênteses. O Brasil, neste sentido, tem muito o que aprender... como se não bastasse os impronunciáveis nomes alemães - Kaiser, Skol - ou o estranhíssimo Brahma (parece sânscrito, literalmente), os novos conseguem piorar: como assim, Schincariol?? Pera lá... o único que salva nesta lambada é a carioquíssima Devassa. Quer algo mais nacional e popular?

De uma forma ou de outra, todos os rótulos tem um desenho ou foto de um lugar famoso, um animal símbolo, qualquer coisa bem 'denominador comum' para todo o espectro de consumidores que buscam a loira gelada. Todos se apóiam e se aproveitam de imagens e imaginário associado a tais ícones para comercializar seu produto e deixar o mundo um pouco mais bêbado - recurso de marketing que não é privilégio da cerveja: produtos de beleza Himalaia, Guarani Futebol Clube, Colégio São Luiz etc, mas como este é um artigo sério, vamos nos ater ao que interessa.

Por isso o título: e o elefante? O que é que leva da Tusker?

A minha proposta manifesta aqui é de se expandir a idéia de direitos autorais para os patrimônios naturais e artificiais da humanidade - pode ser montanha, bicho, cachoeira, cidade. Imagine se, para cada latinha de Tusker aberta no Quênia, dez centavos de dólar fossem para entidades de preservação dos elefantes do Quênia, ou se para cada garrafa de 1 litro de Kilimanjaro gelada fosse direcionada uma mínima parcela para o parque nacional homônimo - em vez de cobrar a vergonhosa soma de USD 110,00 por dia* do turista estrangeiro; ou ainda que o dízimo da Everest ajudasse as comunidades simplérrimas de Sherpas que (sobre)vivem na região que circunda o topo do mundo.

Em vez disso os advogados de plantão continuam preocupados com o tráfeco de mp3 (cabei de inventar: 'tráfego' + 'tráfico') ou com gravação caseira da Cicarelli namorando no youtube.

O reflexo no Brasil seria indubitavelmente benéfico. Já consigo imaginar a institucionalização da devassisse com a criação de uma Associação para gerenciar os recursos que a boemia carioca iria gerar pra classe. O próximo passo seria exportar a Devassa - mesmo porque a devassisse brasileira já anda por aí há tempos...


* O parque conta com uma infra-estrutura ridícula, com um par de jipes velhos que nem entram direito no parque porque não tem estrada e abrigos que não abrigam nem os funcionários. Aparentemente o serviço de resgate justifica algo destes turisdólares - felizmente não o testamos.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Sem Olhar pra Trás

Tem gente que prefere rotina: gosta de voltar sempre pro mesmo bat-café, no mesmo bat-horário, com os mesmos bat-amigos e bat-garçons. Entendo e respeito, mas sou um pouco mais inquieto, particularmente em relação às minhas andanças de mochila nas costas.

Sempre que posso, recuso viajar para lugar repetido. Com espírito bandeirante tardio, prefiro o risco de um lugar desconhecido que a segurança de repetir a dose.

Até uns anos atrás, creio que era simplesmente uma questão de incompreensão da vastidão do mundo, na ilusão de que poderia vir a conhecer tudo. Nada mais lógico, portanto, que curtir os números: fulano visitou todos os continentes, cicrano escalou os 14 picos com mais de 8 mil metros e beltrano já pisou em mais de 100 países. Parei de contar quando me faltavam o Amapá, Rondônia e Acre pra completar os estados brazucas. Logo isso perdeu o sentido, pois percebi que "conhecer" pode ter diferentes intensidades: por vezes tive melhores momentos em um lugar aparentemente sem atrativos, porém com boa companhia. Dou um exemplo: experimente visitar uma metrópole do porte de Nova Iorque ou São Paulo sem um amigo que te leve ao bar do Cidão ou à última peça off-broadway no Greenwich Village? A não ser que você acredite que uma ida ao Ibirapuera, ao Masp e ao Terraço Itália permitem carimbar o passaporte: "conheci Sampa"...

Olhando as coisas dessa maneira, o espírito Indiana Jones sossegou um pouco. Não obstante, segui reticente quanto ao hábito de re-visitar. Mas então a Maca chegava ao Brasil e quis levá-la para conhecer meus principais 'hits'. Qual foi minha surpresa que lugares em que eu havia estado não mais que 5 anos antes estavam completamente transformados e aquelas praias secretas que eu guardara a sete chaves até dos amigos chegados já haviam virado farofada há tempos.

Entrei assim em uma fase reacionária em que não repetia destinos porque eu ficaria muito decepcionado com o 'pogresso', entrando numa fase meio republicana. Mas logo passou. Deixa de ser eco-chato, retardatário, alheio à novidade, pensei comigo. Até parece nego que não ia no Pizza-Hut quando chegou ao Brasil porque acha que toda pizza tem que ser igual a paulistana que ele come todo domingo desde criancinha na casa do vovô. Explico: a meu ver, a redonda do Pizza-Hut tem seu espaço no mercado, com uma devida precaução: rebatismo. Pode gostar ou não gostar do sabor, mas definitivamente aquela gorducha com pimentão e abacaxi deve ter outro nome, porque ela pode ser um biscoito, uma torta, algo assim... mas pizza não é nem a pau! Nem por isso tem que deixar de experimentar.

Com os destinos é algo parecido. Ok, voltar é permitido, mas não crie a expectativa de que tudo ficará como em sua nostálgica memória, de um, cinco ou trinta anos atrás. Há de curtir o que ficou na memória, sem condenar as novas experiências, os efeitos - positivos e/ou negativos, depende muito do interlocutor - do tempo sobre o lugar. Qual o problema de ter luz em Caraíva ou Trancoso? De pavimentarem a estrada pra Visconde de Mauá? De fazerem aeroporto em Morro de São Paulo ou resort all-inclusive em Porto de Galinhas?

O turista deve deixar de se achar proprietário de um destino - que nem paulistano que se acha dono de Itaúnas -, de se achar sapiente do que é melhor ou pior para o lugar, com base em seus ego-interesses de passageiro ou em sua bostinha de aula de economia sustentável toda sexta-feira na GV. E quem fica? E a comunidade?

É evidente que sempre tem gente que ganha e tem gente que perde com as mudanças que a so-called 'civilização' traz. Estas mudanças, no mais das vezes, são motivadas pelo mesmo turista que reclama quando elas chegam (veja o texto 'Rastros'). Também é verdade que muitas das mudanças são motivadas por forças do capital e não visando o bem da comunidade. Mas não pode ser xiita e querer que o lugar congele no tempo apenas para o seu prazer burguês anual de comer une foundue em Monte Verde.

Continuo preferindo novos destinos, mas ciente, agora, que repetir um destino não é pecado. Para desfrutar o repeteco, basta que se mantenha o espírito aberto, como se fosse um lugar novo; lembrando que o novo é, acima de qualquer outra qualidade, o diferente. E - por que não? - deixemos as memórias descansando em paz.

sábado, 8 de dezembro de 2007

Rastros

Turista descolado gosta de dizer que gosta de lugar com pouco turista. O problema é que a maior parte dos muitos turistas que não frequentam resort-all-inclusive ou Stella Barros concorda com esta afirmação, tornando os lugares pouco turísticos muito turísticos. Capisce?

Desde há muito o cientista social abandonou a utopia de ser um ser puramente científico, de ser capaz de imbeber-se do tal 'distanciamento' crítico ao analisar do ponto de vista sociológico, antropológico e outros logos da área. Para o turista não é diferente. Não é necessário ser muito iluminado ou humilde para chegar à conclusão de que nosso olhar visitante é fundamentalmente condicionado. Muito menos para dar-se conta que nossa passagem pelos lugares - mais ou menos turísticos - deixa rastros.

Alguns destes rastros, mais evidentes, carregamos: uma toalhinha com meu nome bordado pela tia, samba no ipod e uma brasileiríssima sacolinha do sacolão da Vila Madalena pra levar o xampú da Tanzânia; outros, deixamos pelo caminho em boa fé: a barraca doada para um pescador malagasi, uma toalha no Nepal, um boné chileno para o menino Himba. Além disso, de forma, digamos, involuntária, fica uma cueca em Angola, um relógio em Zanzibar, as Havaianas numa praia em Madagascar e a escova de dentes no Tibete.

Mas isso tudo é muito óbvio.

Na realidade o que me perturba do rastro do turista - nós inclusive - é aquele rastro menos visível, porém muitas vezes mais contundente. É uma contribuição para o ambiente visitado que pode alterar de forma irreversível o ecossistema. Quais são, afinal, as consequências de dar uma esmola ou gorjeta em local onde isso nunca havia sido visto? De aceitar pagar por uma foto de uma pessoa ou de um monastério? De ganhar segundo lugar no concurso do Jerry Marcoss? De participar de uma cerimônia religiosa em uma tribo africana sem ter idéia do universo místico e dos costumes da tribo? De fomentar a barulhenta e anti-ecológica indústria dos vôos panorâmicos sobre Victoria Falls, Kilimanjaro ou o deserto Namibe? De barganhar demais? De barganhar de menos? De reclamar? De não reclamar? De tentar ensinar batuque de samba pra percussionista nepalês? De deixar um Lonely Planet com um tibetano só porque contém a assinatura do Dalai Lama, sabendo que o novo 'amigo' pega 8 anos de cadeia se um policial chinês pega no flagra? De subir num ônibus na China sem autorização sabendo que quem será punido pela fiscalização é o motorista e não o turista?

Alguém aí já quis ser invisível?

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Tibet




Los ojos de Buda
monjes estudiando




Los amigos del tur: Louise (Australia), Ana (Brasil,
Susannah (EE.UU), Massimo (Italia), Edith (Cuba-EE.UU),
Michael (EE.UU), Maca y More, Gustavo (Brasil) y Carla (Italia)
en el Potala




peregrina















mandala

viejitas tibetanas cantando



banderas de oraciones



yaks (animales peludos del Tibet)




los queridos Michael y Susannah (EE.UU)
el Everest y el fr'io...

cerca de la cima del mundo!!




los peregrinos

Estoy feliz con la manera en que estamos viajando, con tiempo y sin mucha planificación, dejando que nuestras aventuras se vayan haciendo a su ritmo propio, improvisando un poco y dejando que cualquier opurtunidad espontánea aparezca. Así conocimos a Edith, una cubana-estadounidense que nos contó sobre un tur al Tibet posible para nuestros bolsillos. Con el More se nos iluminaron los ojitos "Tibet!", lugar lejano, exótico, poco accesible, vamos!

Yo la verdad es que sobre el Tibet, no había escuchado mucho más que la canción de Mecano ("ha nacido en el país prohibido, perdido en la falda de una montaña, dicen que es la reencarnación de un dios...", del Dalai Lama y algo sobre sus conflictos con la China. Pero estaba curiosa, curiosísima con la oportunidad de estar en un lugar fuera de lo que escuchamos o podemos conocer.

Nuestro viaje al Tibet tuvo dos lados:

EL DURO:

- Desde Nepal al Tibet no se puede ir si no es en un tur, se necesita una visa turística de grupo (no nos gusta mucho la idea de tur organizado).
- Fuimos por tierra en un viaje de 7 noches y 8 días, cinco de esos 8 días fueron de estar en el auto avanzando en el camino durante gran parte del día.
- Gran parte del camino era mala, viajamos en jeep a los saltos entre hoyos y precipicios (el nuevo camino está en construcción, para quien vaya después del 2008 no tendrá que pasar por estas penurias...)
- El frío, el maldito frío, para mí fue lo peor, gélido! Nos tocaron mínimas entre -10 C y -20 C, las posadas y hoteles simplemente no tenían calefacción, no había por dónde escapar...
- La falta de infraestructura. Fuera de las ciudades más grandes como Lhasa, Shigatse y Gyantse, el resto son sólo pueblos en el medio de las montañas. Estuvimos en refugios sin agua potable (y ni pensar en agua caliente), fríos, con higiene dudosa y baños-fosas.
- La altura, More y yo tuvimos suerte, nuestras molestias no pasaron de leves dolores de cabeza y un poco de difucultad para dormir, pero hubo casos de personas en el tur que lo pasaron realmente mal.
- La historia del Tibet: saber cómo se ha dado la historia en este lugar duele.

El Tibet era un reino y un lugar donde la religión primaba (creo que a pesar de los cambios aún prima), pero después de la revolución China, cuando el Tibet fue incorporado ("a la fuerza" y con el costo de miles de tibetanos muertos) a sus dominios la cosa cambió. Sus tradiciones milenarias y sistema de vida fueron prohibidos. Es lo que el Dalai Lama llama de "genocidio cultural". Se instaló el pensamiento de eliminar "los cuatro antiguos": la antigua manera de pensar, la antigua cultura, los hábitos antiguos y las costumbres antiguas. Miles de monasterios fueron destruídos (se dijo que la religión era "veneno"), se les impuso a los campesinos qué debían cultivar y qué no y cualquiera que se opusiera fue arrestado e incluso sujeto a torturas.

Hoy en día las cosas parecen más tranquilas, pero se respira opresión en muchos aspectos. Nombro algo de lo que vi:

El Potala, palacio símbolo del Tibet, está ahí, en pie, pero sin el Dalai Lama dentro y sin actividad interna.
- A los tibetanos no se les da pasaporte...
- Nuestro guía tibetano, quien creció como refugiado en la India y después trabajó ayudando a otros refugiados tibetanos, tiene sus dos brazos quemados...
- Nuestro chofer, nos pide discreta y silenciosamente que le mostremos, sin que nadie vea que él está viendo, la firma del Dalai Lama que aparece en la dedicatoria de nuestra guía de viaje Lonely Planet.
- Nos dicen que cualquier tibetano que tenga una foto del Dalai Lama puede llevarse 8 años de cárcel (=cadeia).
- Estamos viendo cómo las personas rezan en la calle y un grupo de ancianitas, inofensivas, con sus ropas y artículos religiosos típicos tibetanos empiezan a cantar (imagino cantos religiosos), en una cosa de minutos llega la policía y con mala educación les ordenan que paren y que se dispersen, quiero sacar una foto de la escena y me aconsejan que no lo haga si no me pueden quitar la cámara.
- En la noche, tarde, caminando con More de vuelta de un restaurant, un tipo extraño nos ofrece a escondidas una foto del Dalai Lama (como si no supiera que al salir de la China podemos obtenerla en cualquier parte fácilmente...).
- Un turista checo, dentro del Potala, le pregunta al guía por qué el Potala no fue destruido, el guía le dice que no puede responder a preguntas políticas dentro del palacio... (el turista también fue poco delicado).
- Muchas de las paredes en los monasterios están cubiertas con plásticos o maderas.
- La operadora de turismo por la que viajamos nos advirtió a todos antes de salir de Katmandú sobre no hablar sobre política en el Tibet porque sin darnos cuenta, podíamos estar en problemas.

íbamos a conocer un país desconocido y nos encontramos en medio de una realidad difícil, con nuestra cara de turistas observando tímidos, desorientados sobre qué pensar y no pensar. No es fácil tener una opinión concreta sobre lo que está pasando, hay pros y contras, pero de que en el Tibet hay dictadura y opresión, de eso no tengo duda, lo pude ver...

LO LINDO

- Montañas inmensas y nevadas hacia donde se mire, uno se siente ínfimo, es todo es tan grande.
- Viajamos a los saltos en el jeep, pero entre las cuatro puertas tuvimos la compañía de Susannah y Michael, dos cómplices en este viaje que nos acompañaron las 24hrs.
- Pueblitos pequeñitos, en medio de la nada con su arquitectura propia, banderitas de oraciones y animales decorados con pompones y pequeños cascabeles.
- Un cielo impecable, seco y limpio con el azul desde que amanece hasta que anochece.
- Tibetanos maravillosos que te saludan en todas partes y te dan la mano porque sí, solo para conocerte aunque no consigan preguntarte o decirte nada, sonríen y te miran hospitalariamente.
- Monjes dulces dentro y fuera de los monasterios que no se incomodan que los hábitos extraños de los turistas invadan sus estudios y oraciones.
- Estatuas de Buda gigantes, arte, detalles, imágenes, escritos, arquitectura impresionante de lo que queda, cuando uno entra en un monasterio parece que el resto del mundo para... y lo milenario te absorbe...
- "Fe", se ve a los peregrinos en todas partes, en la calle, dentro de los monasterios, arrodillándose y rezando.
- Solidaridad, se ve a las personas más pobres dando donaciones a los monasterios para que estos sobrevivan.
- La fuerza de un pueblo que vive en ese lugar inóspito y difícil.

Creo que el Tibet ha sido el lugar más impresionante y diferente en el que he estado, me gustaría volver (en verano claro), pero tengo miedo, miedo de cómo este lugar va a ser en algunos años, miedo porque tengo pena de que sus tradiciones sigan desapareciendo, miedo de que las sonrrisas tibetanas sean contaminadas por otra cultura de vida. Les deseo a los tibetanos que la historia los ayude y que guarden lo que aún tienen.

Ahora estamos en Katmandú de nuevo, volvimos por tierra pasando por el majestuoso Everest y su campamento base. Nuestra próxima parada es India, dicen que es amable y odiable al mismo tiempo, contradictoria en lo intensa que puede ser, veremos cuáles serán nuestras impresiones.

Cariño a todos!

Maca

(más abajo, publicados en orden cronológico, hay varios textos y fotos sobre Nepal)