domingo, 21 de outubro de 2007

Memorias do Kilimanjaro: NO CUME

Ao chegar ao topo, após quase sete horas de subida mais que íngreme, me arrasto para uma pedra que parecia mais um sofá da Tok-Stok de tão apetitosa para sentar. Ao olhar para baixo, vendo o que acabáramos de superar, a memorável (em muitos sentidos) subida aos cinco mil setecentos e cacetada metros do "Stella Point", última parada antes do pico e definitivamente parte mais dura do caminho, choro. Ao olhar o sol nascendo como um ovo frito - segundo a Maca - no horizonte achatado, choro. Ao perceber que o horizonte estava nitidamente bem abaixo da altura em que estávamos, choro. Mas, ao ver cada pessoa que alcança o mesmo ponto, exausto, inexpressivo, uns com o lábio meio roxo indicando indisposição com altura ou talvez simplesmente muito frio, outros praticamente carregados por amigos e colegas, choro copiosamente.

De tanto chorar, caio na gargalhada, ainda chorando, e sigo viagem: tem mais uma fucking hora pra chegar no Uhuru Peak, Paa La Africa, topo do continente, e não sei de onde aparecem forças. Me penduro nos bastões de hiking - nunca achei que fosse usar essa viadagem, quanto menos depender! - e começo os meros últimos 120m de desnível. O fato de ver as pessoas ao longe, vários pontos coloridos de casacos de frio - roxos, verdes-limão, vermelhos, azuis turquesa - se mexendo e sacando fotos na placa indicativa do pico, fazem a cabeça, mas não seriam suficientes. Um instante antes, enquanto eu tentava desesperadamente engolir uma caneca de chá e uma bolacha doce, não havia cheerleader ou eletro-choque que me tirasse do sofá Tok-Stok. Não haveria glaciar, nascer do sol, vista acima das nuvens, platô nevado, cratera de vulcão, nada que me fizesse mexer o esqueleto novamente para alguma direção que não para baixo, não fosse que a Maca sorriu - estava menos mal que eu - e levantou-se, fazendo piadas e tirando fotos e vídeos da situação. Misturou a inspiração da alegria dela ao meu orgulho por ela ter conseguido e ao meu orgulho próprio de querer conseguir também.

Uma hora mais tarde, pontualmente às 07h35 - ao menos é o que diz no diplominha -, estávamos no topo da África. Ela, tirando fotos e curtindo. Eu, tentando, novamente, controlar o que era mistura de choro e riso.

5 comentários:

Guilherme Jotapê Rodrigues disse...

Não chorei como você porque ia ficar chato aqui no escritório.

Vocês merecem cada calo e cada conquista.

Estão me enchendo de Orgulho. Assim com "O" maiúsculo.

Que viagem apaixonante.

Beijo!

Anónimo disse...

Queridos....
Lágrimas na face...só de ler esse, que eu considero até o momento, o texto mais emocionante!!!
Beijos, muuuuuuuitos beijos.
Paula...

Anónimo disse...

Que emoción leerte More. Que emoción...

Anónimo disse...

Vida mansa...
Estamos viajando com vc a partir do conforto do computador.
Arminio

Anónimo disse...

Maca e Marcelo,
Parabens pela conquista, eu sei o quanto é dura essa montanha. O blog está nota dez!
Um grande abraço,

Horizonte