sexta-feira, 30 de novembro de 2007

Made in China

O chinês é um povo explorador, admirável pela coragem com que deixam sua terra sem ter idéia dos idiomas - sequer do alfabeto - do lugar de destino em busca de oportunidades de negócio, especialmente oportunidades comerciais. Toda metrópole que se preza no mundo tem sua cota de restaurantes chineses e lojas 1,99, quando não bairros inteiros como os Chinatown dos EUA.

Ao visitar o Tibete, nosso limite setentrional foi Lhasa, capital do país - digo, da chamada "região autônoma" invadida no pós segunda-guerra pela China. Neste ano de 2007 foi inaugurada uma sensacional obra da engenharia chinesa: a estrada de ferro Beijing-Lhasa, que levará não apenas milhares de turistas - sem ter que enfrentar as asperezas do caminho via Nepal nem as asperezas do transporte público vindo da China - e milhões de chineses ao Tibete . Além do novo canal de turismo que começou recentemente via trem, o governo chinês criou diversas condições suplementares para levar o povo chinês para o planalto mais alto do mundo - isenção fiscal, facilitação de empréstimos etc. O discurso é aquele tipo Brasília ou Zona Franca de Manaus: vamos povoar o deserto, conquistar as regiões inóspitas do país e tal. A razão verdadeira é a "Revolução Cultural" maoísta que busca dizimar a cultura e particularmente a religiosidade tibetana, garantindo seu domínio territorial e aplacando de vez a crítica mundial que condena tardiamente a invasão de um dos países mais budistas do mundo, crítica esta liderada atualmente por EUA e seus super-prêmios - afinal George W. Bush, após 2 governos sofríveis, ficou realmente conhecido por seu suporte a causas humanitárias, não? - e outros hipócritas que lambem o saco do Dalai Lama e dão prêmio Nobel e tal só para sair no jornal e apurrinhar o rival geopolítico do momento.

Para o bem ou para o mal, Lhasa tem um gosto de China. E o gosto é amargo.

Com estes chinatowns espalhados pelo mundo, acostumamos a conviver com a comida chinesa como um programa diferente ou até exótico. Com o tempo até delivery chinês surgiu e nos EUA é muito bem-sucedido - basta ver filme policial para comprovar. Os imigrantes rapidamente criaram canais de importação para os produtos provenientes de seu país. Por fim, nas últimas décadas, as grandes empresas globais - calçados, roupas, utensílios domésticos, ferramentas e especialmente eletrônicos - passaram a assinar seus produtos "Made in China" em mais uma destas estratégias predatórias da chamada "competitividade", pra não dizer a verdade, que é "exploração máxima da mão de obra barata em busca de maior lucratividade sem importar condições de trabalho". Afinal, isso é problema dos chineses, não? Aí justamente é que todos se enganam.

O resultado é o evidente aumento do poder chinês com o capital estrangeiro e a massiva dispersão de seus produtos - seja indústria nacional, seja produzido internamente para o mercado externo. A crescente substituição de produtos de alta qualidade, duráveis, responsáveis social e ambientalmente, de indústrias nacionais - discurso corrente do que é economicamente sustentável - por produtos Made in China (ou Taiwan, Cingapura, qualquer que seja a bola da vez) mostra um caminho aterrador para a sociedade de consumo - que já não era flor que se cheire.

E eu com isso? No Brasil, assim como em tantos outros países cujas terras foram colonizadas pelos europeus navegadores, e cujo imaginário foi colonizado pela indústria de Hollywood, a burguesia, no melhor estilo looser, acostumou a criticar a indústria nacional e pagar pau para qualquer coisa "importada". Mas a indústria chinesa, presente no Tibete e particularmente onipresente em Lhasa, predica um futuro assustador: tudo descartável, nada reciclável. Olho ao redor e vejo uma imundice e falta de manutenção notáveis - desde o talher do restaurante até a estrada. Nos hotéis, mesmo nos mais caros e/ou novos, a escova de dentes não dura sequer uma escovada, as tomadas não funcionam, a cortina do banho cai sozinha, a torneira da pia suja não fecha, o carpete é imundo (i.e. nunca foi sequer aspirado, apenas varrido), a janela emperra, a porta do armário cai, a maçaneta enguiça, o interruptor é temperamental e o lençol só pode ser brincadeira - não cabe na cama, revelando, na primeira mexida, o colchão do - ora veja só! - Snoopy.

Por estas e outras reforço meus aplausos a um empreendedor como Fernando Curtlo, que faz equipamentos de esporte de aventura e montanhismo (como a atual mochila da Maca) com produtos e mão de obra 100% nacionais. Isso não é nacionalismo ufanista que nem republicano do Texas. Isso é visão de futuro.

Novos e Velhos Amigos

"Claro, se a gente se conhecer um pouco melhor e se gostar e tal, daí a gente troca e-mails e podemos manter contato!".

Que italiano é desbocado e direto eu já sabia. Mas a pertinência da honesta colocação de Massimo durante nosso primeiro almoço no Tibete me surpreendeu e me pôs a pensar.

Em tempos de adolescente, andando pelos corredores do colégio, me sentia popular. Conhecia muita gente, cumprimentava muita gente, conversava com todos com que topava no corredor. No momento em que parti e vivi fora 6 meses - isto foi antes de existir e-mail, crianças! - notei que me correspondia com não mais que três ou quatro companheiros que se davam ao trabalho de me dar notícias e cujas vidas realmente me importavam. Quando voltei, continuava cumprimentando todo mundo, mas bastante mais ciente da diferença entre amigo e colega.

Viajando, século XXI, a coisa é diferente e igual. Difere porque temos o correio e mensageiro eletrônico que facilitam enormemente a manutenção do contato além-mar, ou a qualquer distância, inclusive com o vizinho; Igual porque não interessa, na verdade, a facilidade da comunicação, se o mochileiro tiver clareza da dificuldade que é fazer um amigo de verdade nestas condições e reproduzir a amizade em casa, em outro contexto, outras condições de temperatura e pressão - idioma, amigos originais, rotina, trabalho e família, entre outros.

No exemplo da escola, o dia a dia te obriga a encontrar o colega, como mais tarde o faz uma eventual faculdade ou a rotina do ambiente de trabalho. Mas a distância - seja um intercâmbio escolar de seis meses, seja uma mudança de trabalho ou uma mudança de cidade, por exemplo - obriga a rever esta relação, pois "custa" mais a manutenção da dita "amizade", mesmo com as ferramentas atuais.

Então, com a distância, a amizade genuína pode desdobrar em duas situações: gente que sabemos que não interessa o quanto vamos nos comunicar, o carinho e a conexão são tão fortes que inexoravelmente a relação será mantida, apenas sob novos contornos; e gente que merece aquele esforço extra para regar a amizade e garantir que subsistirá até a próxima oportunidade de um encontro presencial.

Viajando, esta experiência se repete com frequência - maior ou menor em função da personalidade do(s) viajante(s). Cena comum é troca de e-mails na maior das animações, após três dias em um trem, para nunca mais se ver ou sequer trocar um e-mail. Comum também é uma troca efusiva de e-mails a princípio que vai murchando com o passar dos dias e semanas e com a retomada da rotina, até irremediavel e naturalmente cessar o contato.

Nos passados três meses e bolinho, conhecemos, evidentemente, muita gente. A natureza inquieta que nos trouxe para África e Ásia - por enquanto! - se aplica também às pessoas que cruzamos no caminho, sejam visitantes de outras partes do mundo ou habitantes do lugar visitado. Assim conversamos, comemos, viajamos juntos, às vezes por convergência de planos e percepção de mundo, outras por opção, alterando um pouco os planos para ficar por perto. Há vezes, porém, que ambos os motivos concorrem - aspirações e vontade de estar por perto. Então a gente desconfia: pode ser amizade.

Logo percebemos que não estamos apenas conversando sobre o lugar em volta, nem sobre experiências pitorescas de viagem ou dando dicas sobre lugares por que passamos, mas estamos naturalmente falando de coisas de nossa vida, tentando "vender" nosso país para que nos visitem, contando confidências e sentimentos e falando de aftas ou do Ó do Borogodó. Logo percebemos que é mais que troca de e-mails e aquele: "Opa, se estiver no Brasil ou no Chile manda um e-mail!!"

Fica evidente que a relação está mirando ao futuro quando a conversa descamba para os próximos passos de cada um - não próxima parada de viagem, mas planos de vida propriamente. Então você percebe que o contato não é um sofá para economizar dinheiro de hospedagem em Londres ou Bogotá, mas alguém que merece o esforço genuíno da visita amiga, o e-mail perguntando "Como estão as coisas?" pra valer, desprovido da retórica de corredor do colégio. É alguém que merece que você esteja presente - ainda que de longe - no dia a dia. E vice-versa. É alguém que você respeita e sempre respeitará, que cuida e cuidará, como seus poucos bons amigos que ficaram em casa.

sábado, 24 de novembro de 2007

Moda na Montanha

Nascido em São Paulo, comecei a fugir da urbe pré-adolescente, quando acampei pela primeira vez em Ilhabela, levando um aquecedor elétrico que não bastava sequer para ferver água pro miojo. No ano seguinte os mesmos amigos fomos para Itatiaia em uma experiência radical e inesquecível de montanhismo, em um dos últimos anos em que ainda se permitia acampar dentro do parque. Aprendemos na marra a cozinhar, escalar (níveis básicos, obviamente) ficar dias sem banho e cagar no mato. O que nunca superei foi o frio que passamos com nossos recursos básicos de camping. Lá, passamos frio a meros -2 °C no pé das montanhas.

Com o tempo ganhei experiência, fiz muitas viagens para a montanha, e muito embora não me considere um fissurado ou profissional, tenho um currículo razoável para aquele paulistano do começo da história - dei a volta na Ilha Grande em 7 dias de chuva, paseei na Gran Sabana venezuelana, subi Agulhas Negras, conheci de perto o Aconcágua cruzando os Andes da Argentina ao Chile, caminhei dias na Patagônia chilena para ver as Torres del Paine, me arrastei com não pouco custo pra cima do Kilimanjaro, visitei um pouco mais de longe os picos nevados do Nepal e em breve embarcaremos para o acampamento-base do Everest no lado Tibetano da montanha - onde devemos dormir a mais de 5 mil metros de altitude em um mosteiro.

Mesmo após estas pequenas aventuras, continuo sofrendo com o frio e a falta de equipamento. Não sei se sou pão duro, se é sempre um problema circunstancial (viagem longa = roupas leves) ou se simplesmente sou um brasileiro que não se habitua nunca com o frio consequente da altitude. O fato é que não superei o desafio das roupas na montanha: na savana venezuelana, meu irmão Fabio e eu fazíamos rodízio para cuidar o fogareiro aceso dentro da barraca para nos aquecer; no Kilimanjaro usei quatro calças, quatro meias, duas camisetas, três suéters, dois casacos, dois gorros, duas luvas e morri de frio; no Tibete alugamos roupas "especiais" - claro que tudo chinês falsificado -, mas ainda sigo desajeitadamente sofrendo com meu gorro vermelho, casaco verde-azul, calça marrom, meia corinthiana e sapato bege descolando a sola. O que salva é a barba que, após 3 meses, além de divertir os monges do Tibete que me acham com cara de Iaque (tipo de gado cabeludo), esquenta minha cara e de quebra dá pra esconder um dinheirinho ou uma caneta.

Enquanto isso, na sala de justiça, bravos velhinhos europeus tiram de letra o frio dos 5 mil metros da altitude Tibetana com seus conjuntinhos North Face tudo-combinando com as botas Timberland, coerentes com os cabelos brancos moderadamente penteados, não sei por quê, todos pro lado direito. Suspeito até que eles tomaram banho debaixo dos 15 negativos em que dormimos uns dias atrás, perto da fronteira com o Nepal. É tamanha a perfeição como se arrumam, a elegância e desenvoltura como descem calmamente do carro para sacar fotos em meio ao vento cortante do planalto tibetano, que não posso deixar de aplaudir.

Como aplaudir não fosse suficiente, resolvemos criar uma nova categoria de super-heróis da montanha. Em homenagem à excelência de suas roupas e modos, os batizamos de "Os Impecáveis", aqueles que não se deixam abalar nunca pelas adversidades da montanha.

sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Parque Nacional Chitwan


la huella del rinoceronte

la tigresa triste




Después que la Ale y el Pato se fueron, partimos de vuelta a Katmandú para hacer los trámites de la visa para el Tibet.

La visa demoraría unos días en estar lista y ya habíamos recorrido buena parte de Katmandú, así es que decidimos comprarnos uno de los miles de paquetes turísticos "all inclusive" que venden en Nepal (lo más conveniente en el caso) para el parque nacional Chitwan, en el sur, ilusionados con la posibilidad de ver animales en libertad.

Dormimos en un hotel donde nos trataron como reyes (no es malo de vez en cuando.... jeje) y nos sobrealimentaron. Hicimos varios tipos de paseos. Anduvimos en jeep por el bosque que tenía un olor delicioso y nos llevaron a un pequeño instituto donde crían "gaviales", extraña especie de cocodrilo con el hocico (=focinho) alargado (=comprido) en extinción. En ese centro caminamos hasta una jaula donde había un tigre, una hembra, con la mirada perdida. No entendí cómo, estando en un parque nacional, me mostraban un tigre encerrado, pero nos contaron la historia. Una tigresa, que tenía tres cachorros (=filhotes) un día casó un hombre de las villas que rodean el parque, y así otro y otro y otro, en total, seis personas en 65 días. El naturalista del hotel nos explicó que una vez que un tigre prueba la sangre humana se envicia y sigue... Por eso, los habitantes de las villas terminaron linchando a la tigresa y los tres cachorros de tigre, que ya estaban más grandes y que probablemente habían probado la carne humana con la comida que traía la madre, fueron llevados a este centro y enjaulados para protegerlos de que no los mataran también. Eran dos machos y una hembra. Los machos murieron y la hembra, era la tigresa que More y yo conocimos. La historia da pena y más aún la mirada impresionantemente triste de la tigresa que gruñía, solitaria en la jaula...

Dejamos la historia triste atrás y nos llevaron por el río en canoa, vimos cocodrilos y un montón de patos siberianos, además de una puesta de sol con los himalayas al fondo.

Al amanecer nos subieron arriba de un elefante y partimos de vuelta al bosque, estábamos en el mejor medio de transporte para la situación, silencioso, panorámico, obediente y respetado por todos los animales que podíamos encontrar en el bosque. Vimos javalíes, pavos reales (=pavões) y otros pájaros y venados. De repente cuando íbamos tranquilos escuchamos un grito fuertísimo, era un venado que sale corriendo detrás de un grupo de árboles y después otro venado y así varios y el guía nos dice "the tiger!!!" y lo vimos, lindo (la verdad linda, era una hembra), grande, ágil, impresionante, corriendo atrás de los venados. Los venados se agruparon cerca del elefante y la tigresa paró, cerca de nosotros y tranquila nos observó. Los venados corrieron de nuevo y la tigresa los siguió y se perdió en el bosque. Tuvimos suerte, es muy difícil ver un tigre de bengala y más aún tan cerca y cazando. Me impresionó que a sólo unos metros de donde vimos el tigre habían casas y plantaciones, realmente andan por ahí.... y me acordé de la historia de la tigresa triste...

Acabamos nuestro paseo del bosque yendo a bañar a nuestra elefanta en el río y terminamos bañándonos junto con ella, parecíamos niños chicos!

Chitwan, que en un principio fue una opción para pasar el tiempo, terminó siendo un paseo increíble de naturaleza fuerte. Hasta ahora no logramos parar de pensar en el tigre corriendo atr'as de los venados.

Maca

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Ale, Pato y Nepal













































Terminamos África con Madagascar y algunas horas en el aeropuerto de Nairobi, con muchísimas ganas de volver más adelante, para seguir viendo su naturaleza de animales de cuento y su gente, que habla, camina y sonrríe con un ritmo especial que sólo ellos tienen.

Cruzamos de Nairobi en Kenya hacia Katmandú en Nepal, súper ansiosos por las nuevas aventuras que se nos venían y por encontrarnos con el Pato y la Ale (para los que no saben, el Pato y la Ale son amigos míos de Chile muy queridos, de los antiguos, los dos, compañeros de colegio), los que también venían recorriendo lugares diferentes hace algunos meses.
El encuentro fue increíble, ver dos caras conocidas y más aún las de ellos dos, nos dejó demasiado felices y el blablabla sobre todas las aventuras no paró más.


El Patito, de mapa en mano, se convirtió en nuestro guía, el resto, nos entregamos y empezamos a seguirlo por las calles de Katmandú, una ciudad grande, antigua y desordenada, que hace que todos los sentidos funcionen, porque todo está pasando al mismo tiempo. Se ven los colores de las miles de tiendas que venden todo lo que uno se pueda imaginar, se escucha música, la gente y las bocinas de motos y bicicletas, se sienten los olores de inciensos, especias y comidas, se tocan pashminas (lanas) y telas y se come bien, muuuy bien!! Fuimos a un montón de templos, vimos gente rezando y trabajando, caminamos sin parar disfrutando de la compañía de los cuatro y conversamos y conversamos.


Salimos de Katmandú y fuimos a un pueblito en las montañas, Bandipur, "un verdadero tesoro nacional", como lo describe nuestra guía de viaje, un lugar parado en el tiempo. Vimos su arquitectura linda, disfrutamos de las vistas, aprendimos cómo se hace la seda, conocimos su gente hospitalaria y aprovechamos su tranquilidad.


Después partimos, felices en el techo de un bus local, a Pokhara, ciudad tranquila y con lago y base de la mayoría de los trekkings de Nepal. Ahí celebramos el cumpleaños de la Ale maltratándonos con una comida "más elegante" y paseamos por miradores y en bici, pudiendo ver, cuando las nubes nos dejaban, la forma inmensa de los Anapurnas (montañas que hacen parte de los Himalayas).


Estar con la Ale y el Pato nos hizo más felices aún en este viaje, son una compañía extremamente disfrutable y cariñosísimos (muchos de los que están leyendo este texto saben de lo que estoy hablando). Pero nos tuvimos que despedir y los dejamos partir a la India de donde tomaron el avión de vuelta a Chile....


Ale y Pato, suerte con la nueva vida en Chilito, fue un verdadero placer estar con ustedes, en pocos meses seguimos los partidos de cartas, nuestras conversas y paseando juntos "Namaste!!!!"

Besos a todos
Maca

sexta-feira, 9 de novembro de 2007

Entender ou Não Entender II

Em Salvador, nas últimas horas de 7 de setembro de 1999, enquanto todos curavam a ressaca do feriado nacional, meus irmãos e eu chorávamos o falecimento de papai. Na última mirada que lhe dei, antes de deixar os funcionários procederem com os práticos - que meu primo Guto carinhosa e bravamente enfrentava em nosso lugar - percebi que papai carregava uma simpática correntinha de prata com um pingente do que parecia ser uma pessoa com cabeça de elefante e muitos braços, que imediatamente tomei para mim e pendurei em meu pescoço.

Logo descobri que era Ganesh, filho de Shiva, uma das principais deidades hinduístas. Deste dia em diante, por muitas vezes pensei que deveria saber a fundo qual o significado do pitoresco ícone indiano que carregava em meu peito, para, entre outras coisas, não passar aperto quando questionado. Porém, acabei perdendo a correntinha em alguma gaveta, juntamente com seus significados.

Quando Maca e eu decidimos viajar, fomos obrigados a arrumar a casa e muitos objetos havia muito perdidos foram reencontrados e novos destinos lhes foram dados. Entre estes objetos, encontrei a tal correntinha e, após a devida limpeza, ela voltou a me acompanhar para esta longa jornada.

À medida em que se aproxima nossa visita à Índia, a tal questão do significado de Ganesh voltou à tona e passou a me perturbar insistentemente. Que divindade é esta? O que as pessoas devem pensar quando vêem este símbolo pendurado em meu peito? O que devo dizer às pessoas a respeito?

Em meio a estas questões que vinham me assombrando ao longo das últimas semanas, percebi finalmente que, além de todos os significados que ele carrega e seguirá carregando misticamente através dos séculos, há, para mim, um significado muito mais importante e fundamental: era o pingente de papai, e isso basta.

Entender ou Não Entender, Eis a Questão.

Todo membro da burguesia brasileira, em tempos de cursinho, passa por meses bem particulares, uma primeira provação de responsabilidade que indica a aproximação com a chamada "vida adulta". Antes desta fase, quando se estuda, primário ou colegial, passar de ano basta para prosseguir a vida acadêmica em paz. O vestibular, no entanto, vem carregado com outro tipo de aprovação: sim ou não; não há bem um meio termo, do tipo melhor ou pior - exceto nas faculdades em que havia segunda opção, coisa que não sei bem como anda hoje em dia.

Neste tempo adolescente, distinguem-se aqueles que são obstinados - querem entrar em uma boa universidade -, aqueles que são orgulhosos - sentem que podem entrar em uma boa universidade - e aqueles que são obrigados - cobrados, em particular pela própria família, a entrar em uma dita "boa" universidade.

Em meio a esta tensão adolescente, dividido entre o obstinado, o orgulhoso e o obrigado - creio que pendendo um pouco para o orgulhoso -, submergi nos estudos com o propósito de entrar na Politécnica da USP. Neste tempo, obrigação para mim era estudar, obstinação era resolver os desafios de matemática do Ponce - professor de matemática do Anglo - e orgulho era decifrar teoremas e fórmulas que os outros decoravam. Assim, reformular aritmeticamente o teorema de Pitágoras ou deduzir a fórmula de Báskara eram, nestes tempos, atividades de lazer.

Tirando o lado "nerd" da frase acima, uma pequena mágica existe por trás deste chamado "lazer" - ou seja, entender, decifrar, deduzir. É uma arte, um exercício de criatividade e lógica, ao passo que decorar, memorizar uma fórmula, é um simples exercício mecânico, que nunca me pareceu interessante.

Ao fim da faculdade - depois do terceiro câmbio de carreira - criei, com meu primo-amigo-sócio Guto uma empresa - não coincidentemente chamada Primo Comunicação. No entanto, nenhuma das minhas três faculdades, como tampouco a arquitetura incompleta de meu sócio forneciam subsídios para o empreendedor, administrador de empresas, e fomos evoluindo na base da "cabeçada". Pode não ser produtivo, pode não ser rápido ou financeiramente rentável, mas ao fazer as coisas de "cabeçada", senti como quando deduzia os teoremas do cursinho: sua-se muito mais, mas no fim a coisa toda faz muito mais sentido e a gente aprende para sempre. Aprender pela experiência é um aprendizado notável. Assim, de cabeçada, sem colar, sem que o colega ao lado sopre a solução.

Quando viajamos, esta encruzilhada se nos faz presente a cada instante, em todos os lugares a serem visitados. Penetrando-se mundos mais originais e distintos de nossa origem e formação cultural, o universo sígnico é mais complexo e distante. É o caso de regiões e países com religião, idioma, costumes, roupas, alfabeto, arquitetura diferentes de nosso hábito. É o que mais me fascina no mundo árabe e na China, por exemplo - que ficarão para a próxima viagem.

A primeira vez que entramos a um templo hinduísta no Nepal, submergimos no riquíssimo universo simbólico desta religião e nos assolou a seguinte dúvida: ler a bíblia dos viajantes - Lonely Planet e afins - ou, em oposição frontal a este turismo de enciclopédia, deixar os estímulos - arquitetura, esculturas, cores, cheiros, sons, brisa, calor, vista da montanha - te confundirem inteiro para levar a imaginação a um qualquer lugar distante, não necessariamente preso aos paradigmas da história escrita. Quem sabe, no final das contas, se a passiva contemplação não pode levá-lo a deduzir, como num teorema, um universo simbólico de origem tão remota, não obstante cada vez mais presente em nosso cotidiano?

Não prego que é sempre necessário reinventar a roda ou aprender a mexer no celular sem ler o manual. O que é fundamental é não se esquecer da crítica - ou seja, por mais que a roda seja genial, muitas vezes não é a melhor solução para seu problema. Quem já ousou se perguntar por quê o quadrado da hipotenusa é a soma dos quadrados dos catetos sabe do que estou falando.

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

More Famoso!!!

[celo]
- Eeeeee, Marrrcelôô! - ouve-se, de um grupo de jovens locais, com sotaque franco-malagache acompanhado de gostosas risadas, a caminho da padaria.

- Bon jour, Marrrcelô! - diz um pouco mais timidamente um par de meninas nunca antes vistas, perto da praia.

- Ça va, Marrcelôô? - exclama um senhor acompanhado pela esposa e filhos - estes dançando energicamente e rindo timidamente -, enquanto jantamos no restaurante.


Esta era a rotina no pequeno povo de Mananjary, costa leste de Madagascar, ao longo de nossa curta estada. Motivo: concurso de rebolado (= meneo) do Jerry Marcoss - sim, Klauss, ele também tem dois "esses" no nome. Coisa de pop-star.


[maca]
Fuimos al pueblo costero de "Mananjary" para ver una fiesta típica que se hace en la ciudad cada siete años.La fiesta atrae a muchas personas de localidades vecinas y no es sólo folclore, también hay otros tipos de eventos que animan la ciudad. Este año, la gran atracción fue "Jerry Marcoss", el más famoso cantante pop de Madagascar. Jerry es un tipo carismático, con música pegote, bailarinas y parafernalia. Fuimos a su recital de curiosos, queriendo ver cómo era un evento masivo.Llegamos al recital de Jerry, las personas estaban eufóricas, es realmente un ídolo. Estaba absolutamente lleno de locales, nosotros y un amigo turco que conocimos en la ciudad.Bailábamos con todo el mundo, animadísimos, hasta que Jerry decidió hacer un concurso de baile y por supuesto, More, fosforescentemente blanco entre los locales fue apuntado e invitado a subir al escenario con otras personas.

[celo]- "Vahaza! Vahaza!", exclamava a platéia enloluquecida, celebrando o barbudo branquelo que subia ao palco com sua típica camiseta regata com o calendário maya.

[maca]Jerry hizo la primera demostración, mover lo máximo posible poto y cintura era el desafío. More, como buen brasileño, mostró su ritmo defendiendo su sangre entre el espectacular ritmo de los locales. Mientras, un fan club de chiquillas, lideradas por la esposa, gritábamos "¡Marcelo, Marcelo!". Eliminaron a los primeros, los segundos, etc, etc, hasta que quedaron tres finalistas, More incluido.Resultado: segundo lugar y una camiseta roja de la patrocinadora - una companía de celular. Detalle: fue practicamente imposible competir con el tipo que ganó primero, sin desmerecer el ritmo de More. [celo] Além do rebolado que deixa a Carla Perez no chinelo, o cara trapaçeou e ficou mostrando a barriguinha de pugilista. [maca] Pero el segundo lugar y la camiseta no fueron todo... ¡More ganó fama en toda la ciudad! Así comienzó la rutina de los próximos días: "Ehhhh Marcelo!" gritaban las personas en la calle. Todos reconocían a More.

[celo]
... e, no assento ao lado, no ônibus de volta: "Marrcelô!"

... e na parada para almoço - já a centenas de quilômetros de Mananjary - "Marrcelô!"

A perda de privacidade foi tamanha que considerei fazer a barba para não mais ser reconhecido.

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A seguir algumas imagens deste pitoresco episódio.

Jerry Marcosssss faz uma demonstracao para os aspirantes a pop-star. Detalhe: Golpe sujo do futuro campeao mostrando a barriguinha... more nao quis apelar e ficou nitidamente prejudicado pois anda trabalhando muito o abdomen durante o tempo livre.





Galera vai ao delirio quando more sobe ao palco!!!





O astro. Precisa falar mais alguma coisa?


domingo, 4 de novembro de 2007

Arvores que Choram

Antsirabe é a cidade "onde há muito sal" segundo os Malagasis. Para mim, no entanto, o sentido correto deveria ser outro: a cidade "onde as árvores choram".

Na avenida principal desta pequena grande cidade malagasi, grandes árvores providenciam merecida sombra para os passantes. E, em cima de quase todos, derramam lágrimas.

Choram sobre a palma da mão estendida dos pedintes, miseráveis, não obstante ingênuos e nada violentos, que grudam no turista francês - eventualmente brasileiro ou chileno, mas muuuuuuuito eventualmente - para pedir qualquer coisa, desde caneta até pão ou dinheiro. Grudam mesmo, repetindo como se fora um mantra seu pedido, para ouvir a mesma repetida sabatina do turista: "Non".

Choram sobre a palma da mão cansada da pedinte-mãe que percebeu na filha a oportunidade de subsistir: instrui apressada o rebento - que nem bem anda ainda - a correr atrás do senhor de bigode que passa com a camisa dentro da calça fumando Galois, arranhando suas 3 palavras de francês: monsieur, argent, sivuplê.

Choram no chapéu de palha do puxador de "pousse-pousse", versão malagasi do indiano rickshaw (táxi-carroça puxado por gente). São velhos trabalhadores tão miseráveis que alugam um carrinho de madeira para rogar por trabalho puxando gente de um lado para outro de uma cidade de 5 km de envergadura por quantias próximas a um US dólar, utilizando como combustível apenas seus caleijados pés descalços no asfalto quente ou no piso irregular de terra e pedregulhos.

Choram em cima dos vendedores ambulantes de pentes, óculos escuros, batatas-fritas e outras frituras, cartão de celular pré-pago, mandioca, nêspera, manga, tomate, couve, repolho, grão de bico, canetas, cortador de legumes, doces caseiros, radinho de pilha, pilha, chapéus artesanais de palha, bolsas artesanais de palha, camisetas, passeios turísticos e, claro, maconha.

Choram, também, tanto sobre os dedos de violeiros nostálgicos que entoam o velho folclore regional no fim da tarde, quanto sobre os testemunhos de jeová, que se reúnem semanalmente para louvar deus em dedicada cantoria.

Choram no ombro dos poucos turistas que, como nós, caminham. E, caminhando, experimentam esta realidade sem tempero nem preparo, crua como ela é.

...e os poucos automóveis velhos da cidade passam em velocidade mediana; e os muitos automóveis de luxo com motoristas contratados pelos turistas passam em alta velocidade. Sobre seus rostos, claro, as árvores não choram.

Madagascar, sonrrisas gratis

















Llegamos a Madagascar sin esperar nada de nada. Sin expectativas aterrizamos en un lugar del que nunca habíamos oído ninguna cosa.

En Madagascar todo es "mini", desde el aeropuerto, asientos en los buses, ciudades, taxis (preciosas citronetas y renoletas), puertas, escalones, duchas y hasta las personas.

Madagascar está en África, pero es muy diferente del resto del continente negro que ya visitamos. Las personas son una mezcla de negro con polin’esicos (según mi punto de vista), son bajitos, de piel oscura, labios gruesos, ojos almendrados (con un dejo de orientales), algunos tienen el pelo liso, otros no, caminan con un meneo diferente al de todos sus vecinos africanos, pero bailan igual de bien, con el ritmo en la sangre.

Madagascar es un país atrasado, todo es improvisado, en el campo no hay luz, en la noche cuando uno pasa por un pueblo, todo es a vela y cuando hay luz, que es generada con gasolina, la energía se corta constantemente. Las personas cocinan a carbón hasta en los mejores hoteles, los taxis ahorran bencina dejando que los autos vayan al vuelo en las bajadas (¡un terror!), los baños son simples fosas, no hay máquinas para trabajar la tierra (ni siquiera un tractor), sólo zebus (vacunos locales) para hacer la parte más difícil. Practicamente no hay productos industrializados, las mejores golosinas son un plátano o un pedazo de caña de azúcar y no hay supermercados, sólo personas que venden sus productos en la calle.

En Madagascar hay muy poco que no es Madagascar, un puñado de turistas franceses y algo de influencia francesa sólo en parte de la culinaria, el resto, todo impresiona, todo es nuevo, todo capta tu atenci’on.

En Madagascar hay lemures, primates endémicos de la isla que están en extinción... lamentablemente el 85% de la isla está deforestado y eso se ve... y eso los afecta directamente…

En Madagascar los nombres son largos y complicados: Antananarivo, Ravalomanana, Fiaranantsoa, Tsimanampetsotsa, son algunos ejemplos. Algunas personas hablan francés (herencia de la colonia), pero los otros sólo "malagasy", la lengua nativa.

En Madagascar hay "pousse pousse", taxis humanos, verdaderos atletas que corren todo el día para ganarse unos cuantos "aryary" (moneda local) empujando lindos y coloridos carros de madera con un cascabel.

En Madagascar hay fiestas típicas, como la "Samatra", circunsición colectiva que se celebra cada siete años, donde las personas cantan, bailan y celebran la transformación de los niños en hombres (aunque aún sean niños pequeñitos), vestidos con sus trajes típicos.

En Madagascar las personas andan sin zapatos y a muchos les faltan los dientes, pero te sonríen amistosamente ¡y gratis! las sonrrisas más bonitas, las más sinceras, curiosos, en todos lados te saludan con un simpático "Bonjour madame/monsieur" y cuando uno les devuelve el saludo se ríen más aún esperando a cambio otra sonrrisa gratis y se emocionan y no paran de mirarte.

Madagascar es un país virgen donde uno se siente seguro, no hay nada más acogedor que recibir sonrrisas sin esperar nada a cambio, y esa es la imagen que tengo de Madagascar.

Maca


















Amigos: Bret, Kate, Ulrike, Arif y More