sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Havaiana Tailandesa Paraguaia

Não tem por que mentir, sou patriota mesmo. Talvez não seja cego e incondicional como o recém-apaixonado ou obcecado e ufanista como o petroleiro texano, mas gosto pacas de meu país. Gosto da mistura fina de ginga com determinação e criatividade de famílias famintas, sem-trabalho, sem-terras, sem-tetos; de malandragem à toa com a pureza de espírito humilde de tanta gente sofrida; de praia, carnaval, feijoada, samba, mulata, futebol, caipirinha, bem que nem exalta todo o pacote de turismo internacional vendido na Europa. Gosto do doce da jaboticaba e do azedo da carambola. Mas acima de tudo gosto do jeito imperfeito como o brasileiro, sempre de maneira original e improvisada, dá algum jeito de andar, brilhar, suceder, enfim, digamos, funcionar. Gosto e muito me orgulho de, onde quer que esteja, dizer de onde venho.

Brasileiro que põe o pé na estrada, no entanto, já sabe: sua embaixada oficial é e será talvez por muito tempo o futebol. E no futebol, somos reféns dos "erres": Ronaldos, Romários, Rivaldos, Robinhos e outros. Exceto na Índia, onde incrivelmente ninguém nem sabe o que é futebol. Lá, nos faz falta um craque de críquete ou ás no hóquei na grama. A referência tupiniquim na Índia, curiosamente, é Aquarela do Brasil, que anda de moda - certamente uma versão remix que nós graças a deus não tivemos a oportunidade de escutar.

É claro que eu preferia que, acompanhando o futebol, viesse o resto do pacotão com a nossa música, nossa literatura, nosso povo, nossa natureza. Que todas nossas virtudes fossem tão exitosas no mainstream mundial quanto as estripulias do Ronaldinho Gaúcho com uma pelota.
Mas nem um nem outro.

O que pega hoje em dia são nossas célebres flip-flops.

Bangkok é famosa, assim como muitos outros entrepostos comerciais modernos na Ásia, por oferecer produtos baratíssimos, porém fajutos. Se a China tem orgulho de ser tosca - cultura do 1,99 -, Bangkok recebe turistas do mundo inteiro e de todas as idades, que vem passar férias nas belas praias do sul, com uma oferta invejável de produtos de marcas famosinhas pra turista paga-pau consumista como Armani, Gucci, Rai-Ban. Tem até opção pro mochileiro, que também tem seu ladinho paga-pau consumista: North-Face, Lowe Alpine, Doite, Birkenstock etc. Evidentemente que tudo muito barato. Evidentemente que tudo (muito) falsificado.

No meio desse paraguai asiático, saio para comprar uma sandália, já que meu último par de havaianas metamorfoseadas ficou em algum rincão da praia de Mananjary em Madagascar. Desde lá não tive necessidade das legítimas, graças ao clima invernal do nosso roteiro - desde meros 14, 15 graus em Kathmandu ou Delhi até os horrendos -25 do alto Tibete (vai botar havaiana com este clima!!!). Fui às compras.

Percorrendo a famosa Khao San Road, rua da turistada boêmia, tento concentrar-me na sandália, em meio aos milhares de sons, luzes, gente, vendedores ambulantes, motos, mais gente, tuc-tucs e vendedores de insetos fritos. Tinha o nobre objetivo de adquirir meu calçado oficial pro verão. Eis que, espremendo os olhos pra ver melhor, avisto, ao longe, para meu assombro e satisfação, pares de havaianas exibidas lado a lado, bonitinho, que nem loja da Teodoro Sampaio, com diversas cores e um par de diferentes desenhos, inclusive o exitoso modelo com bandeirinha do Brasil.Se isso não bastasse para me encher de orgulho, pergunto o preço - escondendo a cara de guloso para poder barganhar direitinho.

- "Fór Doláh" (Four Dollars com sotaque tailandês).

Hmmm... Olho de perto e qual não é a minha satisfação em descobrir que, finalmente, após séculos de economia extrativista, temos um produto industrializado que não apenas é exportado para Europa, onde é vendido por muitos e muitos euros, mas é também falsificado e vendido no meio de tantas marcas famosas na movimentada e cosmopolita Khao San Road!
É assim que, hoje, caminhando na areia de uma praia vietnamita, encho o peito de orgulho e olho soberbo o resto do mundo do alto de minha havaiana (meio cabeçuda e com uma bandeira nacional bem migué), como se só brasileiro tivesse o direito de vestir havaiana tailandesa paraguaia.


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