Sempre falei mal de Resort. Acho, no entanto, que não compreendia muito bem a amplitude da doença encapsulada neste fenômeno nem tão recente do turismo de consumo.
Todo mundo que vai a um dos tais resorts justifica-se dizendo que 'não quer fazer nada', tem que 'descansar', aproveitar as férias para 'carregar as pilhas' e/ou alega faltar tempo para fazer uma viagem mais elaborada, longa ou livre. Alguém já parou para pensar o quanto isso é estranho?? Quer dizer: justamente o precioso tempo que o cara pode dispôr da maneira que bem entender - suas férias - ele toma para justamente preparar-se para voltar a um cotidiano fastidiante que o esgota de forma que justamente o momento que pode fazer o que quer - suas férias - ele precisa dedicar a 'não fazer nada', 'carregar as pilhas' e otras cositas más.
O cotidiano - trabalho, trânsito, questões familiares, balada, time de futebol - não pode sugar as energias de forma que não sobre energia produtiva ou criativa para nosso tempo livre. Afinal, esse tempo livre é ou não é o nosso tempo mais nobre?
E lá vai o turistão comprar um dos famosos pacotes em lugares vendidos como paradisíacos mas que, em realidade, pouco importam, pois o que realmente importa é que, em todos eles, haverá um exclusivo resort com um exclusivo SPA ao lado do exclusivo campo de golfe. Para restaurar o apetite destreinado de fast-food de almoços de cinco minutos, cinco restaurantes - um obrigatoriamente tem que ser japonês ou tailandês - com menus exclusivos. E, para completar, um quarto exclusivo com varanda, ar-condicionado e TV a cabo, mais um monte de garcom para servir o cansadão, uma piscina com alguma forma original, igualmente exclusiva, para quem tem preguiça de caminhar 13 metros até a praia exclusiva - que, até 5 anos atrás, era uma nada exclusiva vila de pescadores, que agora trabalham na limpeza do... er.. como é que fala mesmo, seu moço? "Rizorte"?
Então o turistão sai do cotidiano para viver o mesmo cotidiano sem surpresas, em ambiente controlado, apenas com uma nova praia ou um alpe suiço como cenário. Evidentemente o staff exclusivo irá preparar exclusivas exibições de shows étnicos de dança, música, exposições de arte, ou esportes náuticos, jantares e passeio de carroça ou dromedário para que o turistão experimente algo da tal da 'cultura local', tire suas fotos de praxe e volte achando que conheceu alguma coisa nova.
Conheceu nada. Experimentou.
Esta é uma diferença fundamental. É, talvez, a mesma diferença entre passear na floresta amazônica ou no Jardim Botânico; testemunhar um tigre caçando de cima do elefante ou passear no zoológico; ir ao aquário municipal de Bangkok ou mergulhar em Richelieu Rock.
Como diz-se do profeta, o turista tem que se perguntar se é daqueles que vai até a montanha ou prefere a montanha que vem até si. Uma coisa é certa: são montanhas diferentes.
1 comentário:
Celo
Tenho alguns comentarios a respeito dessa reflexao sua acerca dos resorts.
Em primeiro lugar, concordo plenamente quando voce questiona o dreno de energia do cotidiano, sugerindo que nao pode ser assim. Porem discuto sua definicao do tempo livre: para mim se ele eh o que temos de mais nobre, "alguma coisa esta fora da ordem". Eu diria que quando o tempo livre se torna tao mais importante que o tempo, digamos, 'utilizado' eh que as energias se esvaem no cotidiano.
Eu vivo acelerada no trabalho, tambem me desgasto nas minhas relacoes interpessoais, cuido da casa. Eh cansativo? Sim. Mas tambem eh muito enriquecedor. Amo meu trabalho, amo minha casa arrumadinha e limpa, amo meu namorido, amo minha familia, amo meus amigos. Hoje termina minha semana de ferias. Estou doida pra voltar pra rotina. Nessa semana eu lagarteei na piscina do condominio, caminhei, fiz jogging (um pouquinho), fiz happy hour com amigos... no fundo tudo muito parecido com resorts onde eu tenha estado. Mas se alguem tivesse me mandado pra Paris eu teria ido muito feliz. E teria provavelmente feito coisas muito parecidas.
Seu texto anterior a respeito de parar e deixar a viagem passar por voce me tocou por ser o meu estilo de viajar. Gosto de sentar num cafe ou num restaurante e folhear uma Elle ou Vogue local pra descobrir a boate que "ta pegando", ir conhecer a boate e as pessoas. Converso com o vizinho no onibus ou no trem. Ate vou a museu, nao pra ver a Mona Lisa, mas pra ver a exposicao dos reis do Egito e conversar com o cara que vende cartao postal no museu; ou pra observar a excursao dos molequinhos de quatro anos que estao estudando a agua e foram ver como Monet a representa em sua pintura.
Eu acho que todo tipo de viagem tem seu lugar, seu momento, seu valor. Cada pessoa tem seu jeito de visitar os mesmos lugares, sejam eles "rizortes" ou cidades, e cada um recarrega as energias de uma maneira particular.
Da mesma forma, cada um se entrega de um modo diferente a cada pedacinho que compoe a vida; trabalho, amor, familia, lazer, tempo, equilibrando - ou nao - as energias de um jeito individual.
Esse comentario enorme comecou inspirado pelo seus textos... assim como tantas outras ideias.
Adorei as aventuras de voces e espero que voces considerem transformar essa riqueza em livro. Cada texto, foto ou passagem tocou muita gente - posso falar por mim com certeza, mas ouvi comentarios de outros tambem.
Nao sei se voces ja ouviram falar nisso, mas tem varias editoras que publicam livro por um valor X, e algumas ate tem distribuicao incluida. Da uma olhada na livraria cultura que foi onde vi isso a primeira vez.
Descobri que voces nao vao mais estar em sp quando eu for prai, que pena! Eu devo ir em setembro...
Boa viagem pra voces, ficamos devendo uma visita ao chile e voces uma a portland...
beijos
guga
ps.: adoro meu avental dos elefantes!!
Enviar um comentário